A série Andantes Futuristas é uma iniciativa do blog Futuros Desejáveis atrelada aos participantes dos treinamentos do movimento Cidades em Transição. O objetivo é registrar depoimentos sobre as experiências pessoais daqueles que querem, entre tantos quereres, mudar e promover o bem-estar coletivo.
O blog Futuros Desejáveis acredita no poder da dádiva e sua máxima dar, receber e retribuir. Dessa forma espera que a interação com e entre seus leitores promova vínculos sociais unidos por laços afetivos e de apoio à causa da Transição.
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Fonte: Acervo pessoal Áurea Brito
Áurea Brito é a primeira entrevistada da série. Formada em história, poeta, narradora da vida, feminista, ativista LGBT, agitadora cultural, agroecologista, ecossocialista, declara ainda ser construtora de sonhos e novos mundos.
Moradora da cidade de Juazeiro do Norte, Ceará, concedeu uma entrevista, ou melhor, conversou com o blog Futuros Sustentáveis sobre sua trajetória e envolvimento com o movimento Cidades em Transição.
Filha de Elzenir e Zé Soares, Áurea ressalta sua ancestralidade no seu jeito de ser: — Quando a gente nasce no seio de uma família, tem uma responsabilidade com aquele coletivo de alguma forma. Todos os nossos alcances, vitórias também atingem nossos ancestrais. Fora isso mistura tudo– diz ela.
A história de Áurea com o movimento Cidades em Transição começou em 2013 quando participou do curso Dragon Dreaming. Foi uma relação de paixão segundo ela; mais de devota do que de acionista no sentido de realização. No contato com Dragon conheceu Melissa Bivar, do Hub Brasil.
Apesar de ter tido contato com amigos em Fortaleza, onde nasceu e viveu antes de se mudar para Juazeiro em 2016, e conhecer algumas iniciativas de transição como a de transformar o bairro Sabiaguaba em um bairro sustentável, para ela sua transição pessoal começou com este curso.
Suas múltiplas atividades e sensibilidades a levaram por vários caminhos da terra e do coletivo. Filiada ao PSOL recentemente, nossa entrevistada manteve contatos diversos com projetos de periferia e a questão comunitária é uma condição em sua existência.
Em 2021 Áurea chamou Melissa para seu programa no Instagram (@aurea.terapia), e desse encontro veio o convite para o treinamento do movimento Cidades em Transição. — Este curso reconectou minha conexão. A partir dele resolvi retomar alguns projetos que não se desfizeram, porém estavam afastados. Eu estava me perdendo porque na vida a gente tem que pagar contas das questões materiais. O treinamento foi o propulsor na retomada dos sonhos — decretou. Ele oferece ferramentas claras e objetivas para que seja feita a transição pessoal. Depois dessa passagem segue-se para o coletivo, nas palavras de Áurea.
— É um treinamento para compreendermos outro paradigma: mente, coração e mãos. E, como conectar mente, coração e mãos se estamos acostumados a mente e mãos, à valorização da práxis? Você aprende a passar pelo coração com as ferramentas e técnicas do treinamento. Essa é a quebra de paradigma, estar o tempo todo mergulhado nesse ciclo. É um curso que deveria estar nas escolas. É isso que verdadeiramente importa – complementa.
Para ela o movimento Cidades em Transição está presente no Nordeste com outros nomes. — Tem gente se envolvendo com o bem viver, com vidas pretas entre outros. Não é projeto Cidades em Transição, mas tem uma intrínseca relação com ele. Aqui é conhecida como a região do Cariri: Juazeiro, Barbalha e Crato. Eu moro no Juazeiro, mas sou voluntária na Casa de Quitéria, em Crato, que trabalha o bem viver. Tudo é meio misturado — explica Áurea.
A questão da luta pela sobrevivência e o entendimento do termo cidades em transição são as maiores dificuldades locais. As comunidades trabalham com ações de preservação da natureza, porém não conhecem a filosofia do movimento. Áurea reconhece que o trabalho comunitário da região é a busca por uma vida mais harmônica, mais saudável, por territórios mais sustentáveis e enxerga nisso o que são as cidades em transição.
A Casa de Quitéria
Localizada na área rural do distrito do Baixio das Palmeiras, em Crato, a antiga construção de taipa do século 18, em homenagem a sua célebre moradora, Quitéria Ferreira Nobre, foi aberta ao público com o nome de Casa de Quitéria, em 2017, um pouco antes da pandemia assolar o mundo em 2020. O espaço é de cultura, memória e resistência para a comunidade do distrito e seu entorno. Áurea é voluntária nas atividades da casa especialmente em suas oficinas. Além desses encontros a feira agroecológica é ponto alto do espaço já que privilegia a produção e geração de renda locais. O projeto tem uma página no Mapa Cultural do Ceará https://mapacultural.secult.ce.gov.br/agente/35029/ na qual toda a história e programação da Casa de Quitéria está registrada. Vale a pena consultá-la.
Oficina de sementes crioulas.Fonte: https://mapacultural.secult.ce.gov.br/agente/35029/
Feira Agroecológica.Fonte: https://mapacultural.secult.ce.gov.br/agente/35029/
Áurea conta ainda que além de ser um espaço que congrega e dialoga, foi pensado para fortalecer os vínculos comunitários. — É um movimento espontâneo da comunidade para fazer frente ao capitalismo esmagador — sinaliza.
O sentimento sobre o movimento Cidades em Transição
Nossa entrevistada acredita que há um elo energético entre os que participam do movimento. Ela pensa numa física quântica e sobre corpos energéticos quando expõe que participar dele é um chamado. — Ele nos une mesmo que a gente não saiba. É um fluxo, e entender esse fluxo também faz parte da formação. Eu mergulho nesse fluxo — afirma Áurea. Para exemplificar o que isso significa ela expõe como ser convidada a dar seu depoimento para o blog Futuros Desejáveis faz parte do fluxo ter conhecido representantes do Hub Brasil e como os elos entre as pessoas vão se ampliando e se conectando indefinidamente. O entendimento dessa conexão vai além do material. O movimento e os treinamentos chamam a uma libertação. — Estamos todos presos numa malha de pensamento onde o padrão é a escassez e o medo. O lastro que sustenta a sociedade capitalista é o dinheiro, e no campo subjetivo, ideológico isto significa o medo e a fome. O sujeito trabalha em regime quase semiescravo num supermercado porque tem medo de passar fome. Não é porque ele quer ficar rico, é porque ele acredita que se não se submeter vai passar necessidades — justifica.
Para Áurea o Futuro Desejável é o da liberdade. — Quando falo em liberdade refiro-me a que todos os seres do planeta possam exercer com maestria sua existência; que uma pedra possa ser pedra; que uma planta possa ser planta; que um cachorro possa ser cachorro; que uma vaca possa ser uma vaca e não um animal para dar leite. Desejo que os seres possam existir pela sua própria existência. A palavra é ser suficiente. Que a gente aprenda a ser suficiente. Se eu tenho o que basta está tudo bem. Privilégio não é necessidade. Ninguém precisa ter cem pares de sapatos, trezentos vestidos, uma pele feita do bicho não sei das quantas. São privilégios e não necessidades.
E, para finalizar esse bate papo esclarecedor e enriquecedor, o blog perguntou para a Andante Futurista: — Qual a provocação que você deixaria para nossos leitores? Depois de pensar alguns segundos, Áurea respondeu: Por que preferimos nos levar à extinção a ter que abrir mão dos nossos privilégios?
Por Mazé Rosolino
Que bela Transição pro Caminho do Coração. Amei!!
Olá Mariana,
Uma trajetória e tanto não é? E você, Mariana, já fez sua transição pessoal? Participa de alguma iniciativa?
Abraço,
Mazé Rosolino
Concordo contigo!
Adorei a matéria! Muito importante a reflexão da autora sobre privilégios e necessidades.
Olá Elaine, obrigada por participar. Pois é, sejamos suficientes como Áurea pontuou.
Abraços,
Mazé Rosolino
Amei tudo que li.
A Áurea é luz!!!
Parabéns a todos